segunda-feira, maio 09, 2005

Bem, há quase dois anos eu escrevi isto. Mas continua mais atual do que nunca...

Sândalo

A dor física se confunde com a dor que me rasgas as entranhas. Vontade de sair por aí gritando todos os palavrões em todos os idiomas para que todo vejam essa solidão que me rasga por dentro e faz eu sangrar em público. Me sinto uma árvore podada no jardim. Uma árvore que às vezes servia como esconderijo nas brincadeiras de esconde-esconde; de sombra para os dias mais quentes; de apoio para as redes... Mas que hoje já não sirvo mais, pois podaram meus galhos, minhas folhas, minhas flores... Me sinto vazia. Esse vazio me explode por dentro. Tenho raiva. Fui usada, fui traída por quem eu mais confiava. O que era para ser a base de tudo é a base do meu nada. Minha família. Aliás nunca foi minha, pois nunca me senti parte dessa gente dormente que vê o mundo passar preocupados apenas com o horizonte que vêem partir de seus umbigos. Tenho vontade de vomitar sobre eles os insultos mais impróprios. Tudo aquilo que sinto quando chego em casa após um dia horrível de trabalho procurando um conforto, uma palavra, um colo, um abraço... que não encontro. Cobranças e mais cobranças. Fico em dúvida se seria melhor voltar para rua, para o ônibus lotado de cada dia. Me sinto infantil demais. Fui enganada pela propaganda da margarina que sempre me mostrou famílias felizes, todos contentes, juntos à mesa farta. Hoje, demasiadamente carente por causa da dor física, sozinha nesta casa, que nem me lembro se um dia foi um lar, repenso minhas idéias, meus conceitos, minhas frases prontas que decorei ao longo desses anos. Não acho respostas. Encontro apenas mais e mais perguntas. O que está errado? Enlouqueci? Talvez. Queria que tudo fosse diferente. No entanto, não é. Eles nunca vão entender minha vida, meu talento, meus sonhos, meus desejos, minha gana de viver. E eu não vou desistir. Só hoje, vou deixar que as lágrimas molhem meu rosto e esvaziem toda dor que está lá dentro. Para renovar meu espírito por mais 24 horas. Viver um dia de cada vez. Sem esperar muito das pessoas. Vou continuar trilhando meus caminhos em busca dos meus objetivos. E não vou desistir. Sou maior que essa dor que quer me convencer em largar todo para alto para viver nesse mundinho pequeno demais da minha família. Meu talento é maior. Minha batalha é muito maior que tudo. Não vou desistir. Me cortem, me machuquem, quebrem meus galhos. Quanto mais me destruírem mais perfume vou exalar. E não adianta me derrubarem, minhas raízes já ultrapassaram os portões e já percorrem outras ruas do bairro. E amanhã se sentirem o sândalo perfumar a casa durante o café não venham se arrepender do que perderam.
Fernanda Maciel 14-9-03