quinta-feira, julho 28, 2005

Você entra por aquela porta eu fico te olhando enquanto você fala em memorandos, comunicados e a tua voz vai sumindo, sumindo e abro um sorriso em homenagem a sua presença ali. Fecho os olhos e sinto sua mão acariciando meu cabelo próximo à nuca, falando ao meu ouvido "vamos sair daqui". Olho de novo e você está com aquele sorriso maroto nos lábios esperando uma resposta minha e eu apenas digo sim, enquanto você agradece e bate a porta.
Volto para a minha vidinha normal de trabalho quando o telefone toca e é você do outro lado, pedindo "por favor, suba até aqui para assinar uns documentos". Eu desligo o telefone devagar e saio em passos lentos, trêmulos. Suspiro antes de bater a porta. Ouço "entra" e de cabeça baixa pego os papéis e assino o mais rápido possível enquanto você me olha atrás dessas lentes.
Saio pelo corredor e tomo um copo de água. O gole vai apagando as faíscas deixadas pela tua presença. Viro e vejo você esperando eu sair da frente do bebedor e nossos olhares se cruzam dizendo "eu também sei o que tu sente, pois eu sinto o mesmo". Trocamos mais um sorriso e desço as escadas correndo e enquanto ouço o barulho de seus passos.
Na saída, encontro você no metrô. Senta o meu lado e não diz nada. Apenas senta, sorri, me olha por cima das lentes da armação azul de seus óculos, como se fosse a legenda dos teus pensamentos. Eu, ao lado, sem compreender a tradução de fato, mas sabendo que o mocinho quer desesperadamente abraçar a mocinha, abaixo a cabeça com um sorriso tímido e o rosto rosado pela timidez. A viagem segue, quando olho para o lado você não está mais ali. Pela janela vejo você na estação acenando pra mim.
No outro dia, a mesma rotina na repartição. Telefonemas, documentos, memorandos, ofícios, comunicados. E você novamente aguardando as minhas assinaturas para enfim despachar as papeladas. Eu preciso ir até sua sala, mas tenho medo que ouça meu coração pulsando acelerado ou os meus pensamentos que gritam o seu nome sem ao menos eu entender exatamente o porquê de tudo isso. Mas o que seria da minha rotina sem você?
Abro a porta com o sorriso fácil de sempre e quando vejo, ela está ao seu lado com o resultado médico nas mãos. Você me diz, "senta por favor". Eu calmamente vou desmoronando sobre o sofá enquanto fixo o detalhe no resultado da ecografia. Você entrega os papéis, assino. Levanto-me e bato a porta ouvindo seu coração pulsar de alegria no mesmo instante em que junto meus restos fragmentados em mil pedaços por você.